segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Sonho número 14.

Era esse mesmo dia no início, com os fatos que realmente aconteceram. Eles eram: 17 horas da tarde, fiquei com sono e fui dormir. Depois começou a virar história.
Acordei em casa (estava antes, na casa de minha avó) em minha cama. Chamei minha mãe, perguntei porque eu estava lá, então ela disse que foi até a casa de minha avó e me trouxe dormindo ainda.
Fiquei triste e encabulada. Não pelo fato de estar em casa, mas sim porque mais cedo naquele mesmo dia, (fato que realmente acontecera) fui ao mercado com minha avó e ela estava toda animada com a possibilidade de eu dormir mais uma noite em sua companhia.
Coitada. Minha mãe deveria ter me consultado antes de me trazer de volta. Protestei, dizendo que tinha que voltar e dormir com minha avó. Já era tarde, 21h, e por isso, minha mãe não quis. Tive de explicar a animação inicial da velha e também (outro fato real) que combinamos mais cedo, que daríamos uma volta na praia na manhã seguinte.
Com isso minha mãe cedeu, pois ela sabia que quase nunca a idosa se propunha a sair de casa. Liguei na mesma hora pra lá, e como era de se esperar, a velha que era triste, acendeu a voz num estalo. Era bom fazê-la feliz.
Então, voltei com minha mochila a casa de minha avó, despedi de minha mãe e ela foi embora. Eu e ela, a idosa de cabelos grisalhos, ficamos vendo TV e jogando baralho o resto da noite. Na manhã seguinte, como o combinado, fomos até o calçadão de Copacabana, e ficamos lá, andando, conversando pegando sol. Me lembro de caminhar pela praia até a noite chegar, mas depois, o cenário mudou completamente.
Estava num hotel ou pousada... não sei ao certo. Estava numa sala grande, rústica, com um monte de crianças vestidas de branco.
Elas me lembravam os órfãos de novelas mexicanas que passam na TV. Aquelas crianças desde cinco a quinze anos, meninas de vestido de renda, meninos de camisa e calça. Todos muito bonitos e arrumados, eles. Todos felizes. Foi isso que me fez lembrar dos órfãos. Todos estarem felizes. Porque, órfãos pra mim, tem a capacidade de ficarem felizes com pouco. Sorriso sincero.
Também tinha um homem. Sei que ele tinha nome, mas não me lembro, assim como não me lembro do meu próprio. Vou chamá-lo de Otávio. Sinto simpatia por esse nome e, além disso, combina com ele.
Pois bem, Otávio era um homem de meia-idade, aparentava 45. Suas roupas me lembravam um cowboy e um fazendeiro de Minas. Uma mistura bem peculiar e que o descrevia com perfeição. Usava uma calça jeans escura e camisa de linho branca, de botões. O cinto de fivela, colete de couro e chapéu do estilo, fazia-no parecer cowboy.
Otávio estava sentado numa cadeira no meio da sala, rodeado de crianças, eu era uma delas. Tinha 14 anos. Não lembro meu nome. Por isso, chamar-me-ei Stella, assim como em vida real. Não lembro muito bem de nossas conversas, e tão pouco de nosso parentesco, meu e de Otávio. Mas, parecia-me que ele contava histórias para nós, crianças. Até que uma coisa incrível aconteceu.
Balões brancos começaram a entrar pela janela da sala, e todas as crianças começaram a correr em sua direção. De repente, uma mulher alta, de cabelos longos e negros, surgiu na janela, flutuando com um pequeno amontoado de balões presos pela mão direita. Todos olharam espantados perplexos pra ela que, como os pequenos da sala, estampava um lindo sorriso.
Otávio levantou-se e foi até lá, estendendo a mão e aceitando alguns balões que a moça oferecia. Eu também peguei alguns e, enquanto ela desaparecia novamente, eu levava os balões para as crianças. Todos assustados com o ocorrido, começaram a falar sobre a cena. Otávio e eu juntamos os meninos menores e sentamos no chão para distraí-los brincando.
Um menino (que agora darei o nome de Jorge), o menor, pegou um balão da mão de Otávio e desamarrou o laço que prendia o ar de dentro dele. Mas, para a surpresa de todos, o ar não saiu de lá. O que saiu, foi um balão menor.
Naquele momento, imaginei que era um sonho. Só imaginei. Pois agora, revivendo o sonho em minha cabeça, sei que nele eu não era "eu", eu era uma personagem qualquer, que não sei o motivo, parecia ser uma das meninas mais especiais para Otávio. Era como se eu fosse a "mãe" de todas aquelas crianças.
Mas enfim, na hora a minha personagem pensou ser um sonho pois o ato de sair um balão dentro de outro, parecia tão comum para todos da sala, que ela ficou assustada. Era comum pra eles, mas pra mim e Otávio, não.
Jorge, gostando na "nova brincadeira" começou a afrouxar os nós de todos os balões e dos balões que saiam destes, até chegar ao menor possível e acontecer outra coisa incrível: de dentro do balão menor, saiu uma flor-de-lótus branca. A essa altura, todos os garotos se juntaram para ver, mas Jorge deixou a flor cair, e dela saíram estalinhos brancos abertos e cheios de pólvora. Jorge ficou todo sujo e o chão da sala também, mas os outros estavam agindo curiosamente.
Foi aí que começou a virar pesadelo.
Miguel, um garoto de seus 11 anos, foi até a lareira que havia em uma das paredes, e pegou uma estaca de madeira com brasa na ponta. Ele saiu correndo até Jorge apontando a brasa em sua direção. A madeira caiu no chão e a chama que antes era brasa começou a caminhar para a pólvora.
Os meninos e as meninas correram para a porta e Otávio pediu para eu correr antes que acontecesse alguma coisa. Pedir ajuda.
"Corre Stella, sai daqui! Corre o máximo que puder!" ele me disse.
Saí da sala e logo depois disso ouvi um barulho de... bem, não explosão, mas de algo pegando fogo, chamas crescendo e se alastrando. Eu não olharia para trás. Corri sem parar, corri, corri como nunca. Desci as escadas de incêndio e saí na rua principal, na estação de trem.
Por um momento, pensei em subir no trem, mas pensei também em toda a minha história, em tudo que deixaria para trás, todas as pessoas; pensei em todo o amor que elas me davam e a família que elas a mim representavam.
Também senti medo. Porque entrar naquele trem, pra mim era como um novo começo. Senti medo de que poderia encontrar do esforço que teria que fazer para reconstruir minha vida. Não queria recomeçar, por medo. Medo da luta. Medo do esforço.
Deixei o trem partir, junto com a lembrança daquelas crianças e daquele homem: minha família. Minha vida.
"Corre Stella, sai daqui! Corre o máximo que puder!" as palavras ecoaram em minha mente. Salve-se.
Com uma lágrima nos olhos, deixei o trem partir e corri para a cidade.
Covarde.

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